A manhã seguinte

24/04/2012

E se a manhã de Elefante for a manhã seguinte à noite de American Graffiti? Duas coisas, de cara, parecem autorizar o estabelecimento dessa continuidade: os dois tratam da mesma fase da vida (ou, ao menos, da mesma idade cronológica): a adolescência colegial; os dois acontecem em um período do dia (a noite de American Graffiti e a manhã de Elefante). Mas, o que se ganha com essa continuidade? Talvez seja possível perceber o movimento de desrealização do real que culmina na hiper-realidade descrita por Baudrillard. Da tentativa de reencontrar o sentido “inocente” da vida no interior da Califórnia numa noite de 1962, empreendida em 1972 por George Lucas e Francis Coppola: a modelagem dos tipos, as cores, a música, a distância nostálgica; até a manhã cansada de Gus Van Sant em 2003: a luz pastel, a proximidade do fato, a despersonalização homogeneizante. No interior da escola de Elefante, o espectador é movido como se estivesse percorrendo os labirintos de Wolfgang 3D, saltando de uma perspectiva para outra, sem encontrar o excesso de estímulos do jogo. Ao invés disso, o que ele encontra é o real desertificado, o pai bêbado, a mãe sem cabeça, os diálogos que não importam, a despersonalização homogeneizante que exige a escrita dos nomes a cada mudança de perspectiva. Tudo lento e banal até a entrada dos atiradores vestindo traje camuflado: um toque de estranheza. Mas, mesmo durante o horror, a velocidade não se altera; a câmera não perde a serenidade. Sem ritos de passagem, resta a prisão do instante: todos imóveis como a flecha de Zenão. Talvez seja pertinente pensar que a hiper-realidade que está presente em Elefante (sem se mostrar porque encapsulada nos indivíduos), já estivesse latente na mostração excessiva de American Graffiti: estranha passagem da diversão ao mal-estar. Saberemos garimpar o real, em busca das diferenças e dos encontros?